terça-feira, 28 de agosto de 2012

Empreste seu cérebro a um adolescente


Responsável pela capacidade de arrependimento, o córtex órbito-frontal custa a amadurecer.

VOCÊ SE lembra de quando era com você? Dotados de capacidades cerebrais crescentes, como raciocínio lógico cada vez mais aguçado e a possibilidade de lidar com informações abstratas, adolescentes questionam as regras que lhes são impostas pelo mundo e querem tomar suas próprias decisões.

Faz sentido: afinal, é tomando decisões e anotando os acertos e os eventuais erros que a gente aprende a tomar boas decisões.

O problema, que deixa pais e professores compreensivelmente aflitos, é que até que a adolescência termine ainda falta ao cérebro, por definição, completar o amadurecimento de uma parte crucial às boas decisões: o córtex órbito-frontal, responsável, entre outras coisas, pela capacidade de arrependimento e, por extensão, da antecipação de arrependimentos.

O impacto é grande. Arrepender-se não é apenas lamentar uma decisão ruim; é reconhecer que outra alternativa teria sido melhor e lamentar que ela não tenha sido escolhida.

Antecipar arrependimentos, portanto, é a capacidade de levantar desde agora várias alternativas possíveis e ainda avaliar quais têm mais chances de trazer felicidade futura ou consequências nefastas. Essa é a base do raciocínio consequente para a tomada de decisões.

E é essa uma das últimas capacidades a amadurecer, lá pelos 17, 18 anos -e que, certamente, continua a se aperfeiçoar com a experiência, até nos tornarmos adultos e, portanto, exímios aventadores e avaliadores de alternativas.

Até lá, tem-se um adolescente que exige tomar suas próprias decisões, mas que ainda não sabe aventar sozinho todos os desdobramentos possíveis.

O que fazer?

Tive a sorte de ser a filha adolescente de um pai que tinha uma solução ótima, antes mesmo de descobrir que a neurociência teria a mesma dica.

Em vez de decidir por mim que eu deveria abastecer o carro antes de ir para a festa, meu pai apenas me oferecia seu córtex órbito-frontal emprestado e aventava para mim as possibilidades que eu ainda não enxergava sozinha: "Já pensou que os postos podem estar fechados na volta? Você pode ficar parada na rua...". Assim ficava fácil tomar a boa decisão de abastecer na ida.

Claro que é preciso um bocado de autocontrole para emprestar sua capacidade de aventar possibilidades para os jovens sem decidir por eles. Mas, para um adulto, autocontrole já não deveria ser problema...

SUZANA HERCULANO-HOUZEL é neurocientista, professora da UFRJ, autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor"(ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com

imagem da internet

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